
Extraído do Livro: Os primeiros Cristãos Urbanos- Wayne A.Meeks
Editora: Academia Crista/ Paulus
Os lugares de reunião dos grupos Paulinos , e provavelmente da maioria de outros grupos cristãos primitivos , eram casas particulares. Em quatro lugares das epistolas Paulinas comunidades especificas são designadas pela frase He kat`oikon ( + pronome possessivo ) ekklesia, que podemos tentar traduzir como “a assembleia na casa de fulano” 1 Cor 16:19, Rm 16:5 etc...
Uma íntima conexão com casas existentes também é sugerida por 1 Cor 1:16, onde Paulo diz que batizou a [ casa oikos ] de Estéfanas , e depois , na mesma carta 1Cor 16:15 , onde se recomenda a casa [ oikia ] de Estéfanas como sendo as primícias da Acaia, cujos membros se dedicaram ao serviço dos santos.
A conversão de alguém “com toda a sua casa”é mencionada varias vezes no livro de atos dos Apóstolos também. As epistolas igualmente mencionam outros grupos , não necessariamente fundado por membros do circulo Paulino , que são identificados pelas casas de Aristóbulo e Narciso (Rm 16:10). As listas em Rm 16:14s de Asincrito , Flegonte , Hermes, Pátrobas e Hermas; Filólogo, Júlia , Nereu e sua Irmã ; e Olimpas provavelmente representam membros de outras três casas de Cloé (1Cor 1:11) e até na casa de Cesar (Fl 4:22). A estrutura local dos grupos cristãos primitivos estava assim ligada ao que comumente era encarado como a unidade básica da sociedade.
A frase kat`oikon não designa simplesmente o lugar em que a ekklesia se reunia , embora as traduções mais comuns costumem ser “a igreja na casa de fulano”. Para isso, em oiko seria a expressão mais natural ( ver 1 Cor 11:34, 14:35). E mais: Paulo provavelmente uma kat`oikon para distinguir esses grupos baseados em casas individuais da igreja inteira (hole He ekkelsia), que podia também reunir-se ocasionalmente( 1 Cor 14:23, Rm 16:23, 1 Cor 11:20 ), ou das manifestações ainda mais amplas do movimento cristão , para as quais ele usaria o mesmo termo ekklesia.
A kat`oikon ekklesia é assim a célula básica do movimento cristão , e seu núcleo era muitas vezes uma casa existente. Como vimos anteriormente , a casa era muito mais ampla do que a família nas sociedades ocidentais modernas, incluindo não só parentes próximos , mas também escravos, libertos , trabalhadores contratados e , algumas vezes , atendentes e parceiros no comercio ou na profissão.
No entanto , a kat`oikon ekklesia não era simplesmente a casa onde as pessoas se reuniam para oração; ela não correspondia rigorosamente aos limites da casa. Outras relações preexistentes , como operações comerciais comuns, também são sugeridas nas fontes e, certamente , novos convertidos deviam ter sido acrescentados ás comunidades existentes na casa. Alem do mais , havia grupos formados nas casas dirigidas por não cristãos , como no quadro mencionado em Rm 16:10,11,14,15 , sem citar a família caesaris. Inversamente , nem sempre todos os membros de uma casa se tornavam cristãos quando o seu chefe se convertia ao cristianismo , como o caso de Onésimo mostra .
O numero de tais assembléias em casa realizadas em cada cidade deve ter variado de um lugar para outro e de uma época para outra, mas podemos afirmar que havia ordinariamente várias em casa local. Em Corinto, por exemplo, Paulo dá especial importância á casa de Estéfanas , como já vimos. O livro dos Atos menciona, além de Áquila e Prisca , que logo se mudaram , Tito Justo que hospedou Paulo, e a conversão de toda a casa de Crispo, At 18:10. Gaio, antes de hospedar...toda a igreja Rm 16:23, provavelmente hospedou um dos grupos de casa. A assembléia domestica na casa de Filemon aparentemente não incluía toda igreja de Colossas ; o mesmo devia acontecer com a assembléia que se reunia na casa de Ninfa, não a única em Laodiceia Cl 4:15.
A adaptação dos grupos cristãos á casa acarretava certas implicações tanto na estrutura interna dos grupos quanto para seu relacionamento com a sociedade mais ampla. O novo grupo era . portanto, inserido numa rede de relacionamentos já existentes ou superpostos a ela, esses relacionamentos eram de cunho tanto interno- parentesco, clientela e subordinação -, quanto externo – laços de amizade e talvez ligações decorrentes da ocupação ou profissão .
A casa como local de encontro , propiciava alguma privacidade , certo grau de intimidade e estabilidade de lugar. Todavia , ela também gerou o potencial para o surgimento de facções dentro do corpo cristão de uma cidade. Podia bem ser que as facções incipientes a que Paulo se dirigia em 1Cor 1-4 estivessem baseadas em diferentes casas.
O contexto da casa também provocou alguns conflitos mo exercício do poder e na interpretação das funções na comunidade . O chefe da casa , segundo as expectativas normais da sociedade , deveria exercer alguma autoridade sobre o grupo e deveria ter alguma responsabilidade legal sobre ele. A estrutura do oikos era hierárquica e o pensamento político e moral contemporâneo encarava a estrutura das funções superiores e inferiores como sendo básica para o bem estar de toda sociedade.
A centralidade da casa tem implicação posterior para entendermos a missão Paulina: ela mostra como são inadequadas nossas concepções individualistas modernas de evangelização e conversão. Se a casa existente era a célula básica da missão, então deduzimos que os motivos básicos para alguém passar a integrar a ekklesia provavelmente variaria de um membro para outro. Quando uma casa se convertia ao cristianismo mais ou menos em bloco, nem todos os que adotavam as novas praticas faziam-no com o mesmo grau de compreensão e de participação . A solidariedade social deveria ser mais importante para persuadir alguns membros a serem batizados do que o seriam a compreensão ou as convicções sobre crenças especificas. Qualidades e graus diferenciados de compromisso com o grupo no principio não seriam de admirar.
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